terça-feira, 7 de maio de 2013

Crônica - Fantasmas



HISTÓRIAS DE FANTASMAS




Pouco antes das onze, o papo no boteco enveredou pelas brumas do fantástico, do inexplicável, do sobrenatural. Bom, mais ou menos: o clima era descontraído demais, ao menos em comparação ao de uma sessão espírita ou, sei lá, do exorcismo da Emily Rose. “Não acredito em fantasmas, em anjos ou em Deus”, bradou meu amigo, olhos injetados de birita e com uma determinação vitorbelfortiana de nocautear qualquer Gasparzinho ou espectro não-camarada que por ali passasse.

Comedido, desviei-me estrategicamente do tópico “Deus”. Também me abstive de discutir o sexo dos anjos, mas tive que dar razão a ele no que se refere aos fantasmas. É fato: embora funcionem bem no cinema, assombrações só podem ser contos da carochinha.

* * *

Acompanhe meu raciocínio.

O sujeito é advogado, físico nuclear, neurocirurgião ou conferencista. Já defendeu teses importantes, palestrou em universidades e cativou centenas de pessoas com sua lucidez e eloquência (sem mencionar seu senso de humor oportuno e inteligente).

Entretanto, ao morrer, a primeira coisa que faz é se cobrir com um lençol, esconder-se no sótão e gritar “Buuu!” para o primeiro infeliz a lhe passar pela frente.

Não, não!

Isso não faz sentido...


* * *

O leitor pode contra-argumentar, me garantir que “as coisas não são bem assim”. Afinal, Hollywood nos mostrou fantasmas BEM assustadores. Tipo aqueles do “Iluminado”, do “Sexto Sentido” ou do “Chamado”.

Lençóis – consideremos a alternativa – poderiam ser os “modelitos” usados por defuntos pouco imaginativos. Digamos, a “gente diferenciada” do limbo, a classe C do plano astral. Pense naquela cantora Joelma.

Um fantasma de respeito recorreria a truques melhores para arrepiar os cabelos dos vivos. Talvez a Wetta Digital (ou aquele maquiador artístico famoso, Rick Baker) tenha uma filial no além, atendendo aos defuntos abastados que podem pagar por “scary looks” mais legais – machados enterrados na testa, faces parcialmente destruídas e com os ossos se projetando da pele, enfim...

É como o Carnaval: quem pode torrar R$ 1.500,00 em uma boa fantasia aparece na Globo. Quem não pode se contenta em curtir a folia usando chinelo de dedo e sacolinha do Carrefour na cabeça.

* * *

Se o além for mesmo como nos filmes, acho que estão faltando, por lá, alguns programas de motivação. Workshops que auxiliem a alma penada a dar um passo além, a progredir no plano não-corpóreo.

Que tremendo desperdício de energia passar a eternidade assustando os vivos! Afinal: os vivos já têm muito com que se assustar. As prestações do financiamento, faturas do cartão com mais de quatro dígitos, inspeção veicular, renovação do seguro do carro, a sucessão da Dilma, a décima terceira edição do Big Brother...

É infindável e eclético o purgatório que nos rodeia. Neste cenário, quem tem medo de um espectro macilento a nos observar malevolamente do canto da sala?

De fato, em certos noites – em momentos críticos do mês –, periga eu convidar o fantasma pra tomar umas e outras por minha conta. Contanto que ele me ouça e não me julgue.

Entende..?

* * *

Fato é: os fantasmas estão perdendo grandes oportunidades, considerando o que podem fazer quando abandonam os limites da carne, quando se divorciam das leis do tempo e do espaço.

Por exemplo: o que um fantasma “macho” ganharia assombrando o meu apartamento, quando poderia espiar a Ana Hickmann pelada no chuveiro sem ser processado por assédio? Sem considerar o cenário: há terreiros mais interessantes para “baixar” que o meu humilde cafofo.

Certos, mesmo, estão os fantasmas da Inglaterra ou da Irlanda, que levam um vidão digno da Revista “Caras”. Ok, não há castelos para assombrar no Brasil – entretanto, na qualidade de fantasma, eu já me contentaria em assombrar uma suíte do Maksoud Plaza ou um daqueles hotéis chiquérrimos da Amazônia.

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Quando estiver “do outro lado” (se é que existe um “outro lado”), também questionarei os métodos de comunicação empregados pelas almas penadas para se comunicar conosco. Sou jornalista. Interessam-me essas coisas. Tenho autoridade para garantir que, embora fosse um bom truque em 1820, recorrer a uma tábua Ouija ou a um copo para formar sentenças muito longas é dos métodos mais ineficazes para se fazer entender.

Ainda mais hoje em dia, quando estamos na era do “Facebaak” e do Twitter. Até as TVs, agora, se conectam à Internet. Soletrar sentenças muito extensas (por exemplo, “todos nesta sala morrerão, a começar dos que não acreditam!”) é contraproducente e desgastante. E, do ponto de vista da plateia, uma experiência enfadonha.

Assombre-me, me assuste...

Mas não me faça perder tempo.

E “Buuu” pra você também!