"OLHEM PARA O CÉU!"
Os extraterrestres já eram.
Quer dizer, se é que um dia chegaram a “estar”.
Contrariando as previsões do filme “Contatos Imediatos do
Terceiro Grau” – que assisti boquiaberto no Cine Paissandu, uns 30 anos-luz
atrás –, nenhuma nave-mãe baixou na Terra para promover radicais transformações
sociais (por exemplo: presentear-nos com vacinas anticâncer, quebrar a patente
da Coca-Cola ou inseminar a Susan Boyle com um embrião alienígena).
Sinto-me enganado: passei anos assistindo a esses filmes
idiotas, no que poderia ser um esplêndido exercício de simulação para um
encontro com raças superiores, e o que ganhei?
Um monte de cáries!
Afinal, a pipoca do Cine Paissandu era puro refugo, naquele
tempo...
* * *
É sério: alguma coisa deve ter acontecido na constelação de
Alfa Centauri ou nas luas de Júpiter, pois o cinema americano desencanou geral
dos maquiavélicos homenzinhos verdes. Nos anos 50, eles dominavam o telão. O
bordão “Olhem para o Céu!” estava na boca do povo e bem-representado em
centenas de produções “B” que lucraram os “tubos” com essa paranoia. De vez em
quanto fazem remakes desses filmes – ou o tema é engenhosamente reinventado em
séries como “Arquivo X” ou “Taken” (aliás, também extintas). Mas a atitude
dessas atrações é outra: nem os produtores e diretores parecem mais acreditar
em discos voadores. Ninguém em sã consciência continua “olhando para o céu”.
Exceto, é claro, quando está no dentista. Ou se morar em São
Paulo e no Rio de Janeiro, onde as chuvas se tornaram muito mais ameaçadoras
que qualquer Alien ou Predador. Ficou decidido e sacramentado: não há vida
inteligente fora da Terra.
Alguém pode contestar essa afirmação depois de
“Transformers”?
* * *
Agora: se eu me sinto enganado, imagino como ficou o Luizão...
Em outros carnavais – em outra “dobra temporal” –, Luizão
era o cara descolado da rua. Nunca tirava notas baixas, nunca ficava de exame,
nunca bombou em Matemática. Mais velho que nós, usava camisas sociais quando
todos vestíamos cacharrel bordô (nos anos 70) e calças e camisas “OP” (nos anos
80). Passava por nós, impávido, a cabeça esbarrando em outras constelações. Com
uma revista “Planeta” embaixo do braço, óculos escuros de grau e uma barba de
respeito para sua pouca idade.
Luizão foi o primeiro (e único) “ufólogo” que conheci.
Levava muito a sério as teorias do Erich Von Däniken (“Eram os Deuses
Astronautas?”). E tinha explicações “racionais” para cada fenômeno da Bíblia.
* * *
“A Arca de Noé era um OVNI!”, declarava Luizão, muito seguro,
quase como se recitasse o número do próprio R.G. “A carruagem de fogo de Elias?
Um OVNI, também. E não vamos esquecer a destruição de Sodoma e Gomorra...”
“O que é que tem a destruição de Sodoma e Gomorra, Luizão?”,
perguntávamos nós, curiosos e previamente aterrorizados com a resposta.
“Ah!”, exclamava o ufólogo da rua, algo impaciente. “Bombas
atômicas! Os alienígenas já tinham bombas atômicas naquele tempo. E as usaram
para pulverizar Sodoma e Gomorra. Simples. É tudo científico, entendem?”
Nós não entendíamos, mas aceitávamos sua palavra.
Aquele era o Luizão. Praticamente uma Enciclopédia Barsa do
“Inexplicável”.
* * *
Nunca mais ouvi falar dele, até que um amigo em comum,
Leandro, me disse que Luizão fora entrevistado em um programa da rádio AM
(veiculado durante a semana, por volta das 03h30 da madrugada).
“Era o Luizão, eu juro!”, disse Leandro. “O apresentador até
se referiu a ele como ‘o ufólogo de Santana'.”
“Não!”, exclamei.
“Pois é!”
“E o que ele disse?”
“Disse que vai haver um contato em pouco tempo...”
“Um contato?”
“Sim.”
“Como assim, um ‘contato’?”
“Um contato. Você sabe...”
“Não sei, não.”
“Tipo...”
“Hum...”
(...)
“Beleza, Edu! Vou nessa, tenho que pegar a Marina no Metrô.”
“Manda um beijo pra ela. Quer carona até a Cruzeiro do Sul?”
“Se não for incômodo...”
“Sobe aí.”
* * *
Ocorre, leitor, que gente como nós – eu e o Leandro – somos
“estrelas anãs” nessa galáxia de mistério e terror que tanto intriga pessoas
inteligentes e preparadas como o Luizão.
Afinal, o próprio Luizão nos disse, uma vez:
“Vocês estão aqui para fazer a engrenagem girar. A função de
vocês na Terra é operacional. Por isso se interessam por sexo, por comprar
coisas... Alguns de vocês vão até se casar e procriar. Já eu... já nós...”
“Nós quem, Luizão?”
“Nós, os ufólogos. Estamos nos preparando para sermos a
linha de frente quando eles chegarem...”
“Ah...”
* * *
Soube que Luizão se casou há alguns anos. “Como” ou “por
que”, nem imagino. Segundo o Leandro, que o vê com alguma frequência, Luizão
não está mais interessado nessas revistas com E.T.s, o Caso Roswell ou a Área
51 estampadas na capa. Que eu saiba, tampouco vai ao cinema. Hoje, tem um filho
para criar, uma esposa e um emprego digno em uma assistência técnica
multi-marcas do Jaçanã.
Qualquer dia, vou lá sacaneá-lo. Colocarei meu celular
quebrado sobre o balcão e, muito sério, lhe direi: “Sony Ericsson inoperante...
Ajuda! E.T. precisa telefonar casa!”
Quando ele ficar puto, conterei sua raiva com o dedo em
riste, apontando para a sala da Gerência.
“Nenhum movimento brusco, homem da Terra. Eu venho em paz.
Agora, seja um bom rapaz e leve-me ao seu líder!”