"VERUSKA, MON AMOUR!"
Nada a declarar: de poucas palavras e atitude rebelde, ela foi o primeiro amor do office-boy Cleverson
Em minha página no Orkut, a foto que mais “bombava” era uma
em que eu aparecia ao lado da musa tcheca do pornô Silvia Saint – estrela de
clássicos como “Missão UrÂnus” (sacou?), “Prostitutas Estelares Vol. 32” (sério!) e “The Private
Life of Silvia Saint” – este, uma produção classuda da Private.
A foto é verídica. Em 98 ou 99 eu a entrevistei para a
finada revista “Putz!”, periódico de humor inventado por meu bom amigo, Ricardo
Sasso (infelizmente, ele desencanou do jornalismo; atualmente é o feliz
proprietário de três lojas da “World Tennis”).
A “Putz!” tem fãs devotados até hoje, mas a verdade é que
não vingou nas bancas. Também pudera! A revista apelidou o místico Walter
Mercado (ligue djá!) de “O Homem Hebe
Camargo” (havia mesmo uma semelhança física entre as duas celebridades);
perguntou à diva Luana Piovani o que ela pensava quando fazia cocô; e foi a
primeira publicação a ter Inri Cristo como colunista fixo.
Em suas colunas, Inri (que se diz a reencarnação de Cristo –
nem mais nem menos) se “auto-citava” pomposamente a cada três linhas, pinçando
pérolas de sabedoria de seu próprio evangelho...
A “Putz!” não sobreviveu porque foi lançada uma década antes
do “CQC” e congêneres e, como tal, era um veículo à frente do seu tempo. Sinto
saudades da publicação e não é para menos. Poxa: eu aparecia ao lado do próprio
Jesus Cristo no expediente de colaboradores!
* * *
A entrevista com a Silvia Saint aconteceu no “sex shop” de
um grande amigo meu, Diego. Sim: eu tenho um amigo proprietário de “sex shop”.
E isso não é tudo: ele também é argentino! Somos amigos porque, apesar de
nossos estilos de vida diferentes, temos paixões em comum: peitos, rock’n’roll
e chá gelado do Rei do Mate.
Diegão sempre foi a providencial “mão na roda” nessas pautas
estranhas que, de tempos em tempos, eu fazia para a “Putz!”. Em certa ocasião,
eu e um fotógrafo levamos duas patricinhas ao “sex shop” para ver a reação das gurias da zona sul às capinhas escatológicas nos mostruários (e àqueles enormes consolos de
borracha nas paredes).
Era para ser uma pauta engraçada, mas fiquei decepcionado:
as meninas nem se abalaram. Pelo olhar de tédio que lançaram aos brinquedos
expostos no “playground dos horrores do Tio Diego”, percebi que elas já tinham
visto coisas bem mais escabrosas na “night” paulistana. Não tem jeito: a
realidade é sempre mais fascinante do que a ficção!
* * *
Também da loja do Diego saiu “Veruska” (assim apelidada por
mim e pelo Sasso), a musa de plástico e poliéster utilizada em um bizarro
“test-drive de boneca inflável" publicado na “Putz!”.
Na época, os americanos tinham inventado umas mulheres de
borracha perfeitas e confeccionadas sob encomenda. Apelidadas de “Living
Dolls”, elas tinham peles sintéticas que “esquentavam” embaixo do chuveiro.
Cada uma custava, em média, US$ 5 mil.
Claro que não havia nada do gênero no Brasil – portanto,
pagamos R$ 100,00 paus na Veruska ("É preço de custo!", garantiu
Diego) e convencemos um office-boy da editora a comê-la durante um fim de
semana, sob o compromisso de nos contar tudo tim-tim por tim-tim na
segunda-feira.
O menino arregalou os olhos e pensou que seria uma boa, mas
seu entusiasmo minguou quando eu e o Sasso tiramos Veruska da caixa. O moleque
pensou que passaria o fim de semana com uma Catherine Zetha-Jones biônica, mas
o que levou pra casa foi uma versão “drag queen” do C3PO.
* * *
Fui encarregado de pegar o depoimento do rapaz e precisei
desligar o gravador várias vezes durante a entrevista, às gargalhadas. Chegou
uma hora em que eu e o office-boy rolávamos de rir no terraço contíguo à sala
do Sasso, tamanha a bizarrice de tudo aquilo.
Veruska era feia, mas, fora da caixa e “inflada”, até tinha
um ar simpático. Lembrava o robô “Omni”, concorrente do “Arthur” na preferência
das crianças em 1982. O problema é que, apesar de ter sido projetada para isto
– e só para isto, como o atestavam os obscenos “furos” em sua boca, periquita e
bumbum de plástico –, a guria era decididamente ruim de cama.
Ou “ruim de chuveiro”, pois foi assim que o menino tentou
levar a cabo a heróica missão de traçá-la. Disposição ele tinha, de sobra – mas
Veruska era uma amante rebelde: saltava como uma truta quando era abraçada com
mais empolgação e, lubrificada com água e sabão, executava autênticos saltos ornamentais
sobre o box, quicando no teto e aterrissando de ponta-cabeça no chão azulejado.
Diferentemente do artigo “Patricinhas no ‘Sex Shop’”, este
ficou ótimo e foi um sucesso. Espero que o office-boy Cleverson tenha se
recuperado de sua inglória iniciação sexual com a Veruska.
* * *
Noves fora, “sex-shops” são locais muito promissores para
estudos sociológicos / antropológicos sobre a diversidade do prazer humano. Diego
me disse, por exemplo, que a maior saída de produtos em sua loja é de filmes
com travestis. Sim – em um país machista, como o Brasil, há grande demanda por
filmes com “bonecas” (e não me refiro a “bonecas” como a Veruska!).
Diego também me garantiu que aqueles consolos na parede,
expostos como vísceras de boi em matadouros, têm bastante procura. Não são
apenas artigos decorativos, como eu pensava. “Teve um velhinho de 73 anos que
entrou aqui outro dia e comprou um consolinho deste tamanho (ilustrando o
tamanho diminuto da peça com as mãos)”, disse meu amigo. “Era taxista, avô de
três netos e me confessou que relaxava dirigindo com aquilo enfiado no rabo.
Pode isso, Torelli?!”
Um dia, intrigado com a variedade de formas e tamanhos dos
objetos vistos na loja, apontei para uma peça de plástico enorme, que lembrava
um tronco de árvore cortado. Não se parecia com nada humano – e apesar da minha
criatividade prodigiosa, não consegui imaginar como aquilo se encaixaria em uma
relação sexual (envolvendo qualquer indivíduo, orientação sexual ou grau de
psicose conhecidos).
“_ E aquilo, Diegão? Pra que serve?”
A resposta do meu amigo diz muito sobre os caminhos
tortuosos da sexualidade humana, que desafiam até o repertório de um proprietário
de “sex shop”.
“_ Não tenho a menor ideia. Mas pode ter certeza: um dia
alguém vai entrar aqui e pedir para eu embrulhar.”
Eu até poderia retrucar. Mas quem sou eu para contrariar um
especialista?